(Atualização: 30/11/20, às 20h46)
Recentemente perdemos a magnífica Jane di Castro (23/10/20). Relataram que sua irmã, evangélica, ao saber do óbito, chegou ao hospital e expulsou os seus dois amigos que tinham estado com ela o tempo todo da internação, se referindo à Jane pelo masculino. Depois divulgou-se que não haveria velório e seu corpo seria cremado. Mas houve sepultamento. O grupo Arco-íris e Leandra Leal estiveram presente e homenagearam a sua memória (o sepultamento realizou-se no Jardim da Saudade, zona oeste do Rio de Janeiro).
Marquesa, integrante do Divinas Divas, faleceu em 26 de maio de 2015. Foi velada com o nome masculino na parede da capela. O padre se dirigiu a ela no masculino.
Não se tem notícia da destinação do acervo pessoal (fotos, troféus, cartazes de shows e peças, vestuário etc.) de Marquesa, Cláudia Celeste, Rogéria, Jane di Castro, Miss Biá…
Händel Georg Friedrich conta o caso de Vera Verão (Jorge Lafond), falecida em 2002. Segundo a imprensa:
“Vejam o caso do genial Lafond: tinha doença cardíaca congênita, deixou um seguro para o namorado no valor de 450.000 reais, além de jóias e patrimônio imobiliário. Como não deixou testamento lavrado em Cartório, os primos que mal se falavam com ele e, se aproveitando desse fallo burocrático, conseguiram se apropriar de tudo. Os advogados especialistas em inventários removem céus e terra, caso o inventariado não tenha deixado tudo muito bem escrito, assinado e atado em vida.” (Ressalva para o seguro, que não segue a sucessão hereditária; o nome registrado na apólice como beneficiário será aquele que receberá).
Em 2018 foi noticiado que os restos mortais de Lafond desapareceram do cemitério, juntamente com as joias com as quais foi enterrado.
Já o cantor e compositor Osvaldo Nunes, assassinado em sua casa por um michê (18/06/1991), teve a sua vontade respeitada – todos os seus direitos autorais e o apartamento onde morava, na Lapa, ficaram para o Retiro dos Artistas. Osvaldo Nunes tinha deixado um testamento. Mesmo assim, familiares tentaram revogá-lo judicialmente. Não conseguiram. Onze anos depois, o judiciário sentenciou pelo respeito ao testamento.
Precisamos que esses desrespeitos deixem de acontecer. Nós queremos que a nossa dignidade seja respeitada também após a nossa morte. Por isso estamos com a campanha Dignidade Também pós Morte – pela Criação do Dia do Testamento, com campanhas de conscientização e redução nas custas.
Precisamos trabalhar a construção do hábito de já deixar tudo explicadinho, para evitar problemas, brigas, injustiças, dilapidação e falta de respeito com a nossa identidade de gênero, os e as nossos e nossas amigos e amigas:
* Declaração antecipada de vontade, para a especificação de quais tipos de tratamento aceita na eventualidade de doenças com a perda de consciência; como deseja velório e sepultamento (ritos religiosos, formas de sepultamento, respeito à identidade de gênero, vestimenta fúnebre etc.). – Pode ser formalizada através da Defensoria Pública, escritórios-modelo de faculdades de direito, ONGs do movimento LGBTI+.
* a destinação do acervo pessoal (livros, móveis, roupas, papeis, revistas, jornais, fotos, postais etc.) – escritura pública em cartório. Codicilo ou junto com o testamento. Para a redação, consulte uma das instituições acima.
* a destinação do patrimônio (bens imóveis, móveis, dinheiro, ações etc., via testamento)
– Apenas são herdeiros necessários (legais/obrigatórios), ascendentes (pais, avós, bisavós), descendentes em linha reta (filhos, netos, bisnetos) e, também, os cônjuges/companheiros (alteração advinda com o Código Civil de 2002, para os cônjuges, e companheiros por decisão do STF que proíbe companheiro de herdar menos que cônjuge, me corrigiu o querido Dr. Paulo Iotti).
– Sobrinhos e primos não são herdeiros necessários. Herdam somente se não houver testamento destinando em contrário ou se (e como) forem beneficiados por ele.
– Se não houver os herdeiros necessários, pode-se destinar a totalidade do patrimônio. Havendo, pode-se testar livremente 50%. – escritura pública em cartório.
Para a sua redação, consulte uma das instituições mencionadas no primeiro tópico ou um advogado de sua confiança.
Se você concorda, assine conosco: Dignidade também pós morte
Fazem parte dessa campanha, entre outros:
Rita Colaço – historiadora, mestre em política social, graduada em direito
Memórias e Histórias das Homossexualidades
Paulo Iotti – Doutor e mestre em direito constitucional, advogado
Toni Reis – Presidente grupo Dignidade de Curitiba e da Aliança Nacional LGBTI
Luiz Morando – doutor em literatura, pesquisador história e memória LGBT em Belo Horizonte
Remom Bortolozzi – doutorando em saúde coletiva, responsável pelo Acervo Bajubá
GADVS – Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero
Museu Bajubá
Acervo Bajubá
Resistaorp!
CLOSE – Centro de Referência da História LGBTQI+ do RS
Rede de Historiadores/as LGBTQIA+
Referências
https://memoriamhb.blogspot.com/2020/10/jane-di-castro-nos-travestis-e-que.html
https://memoriamhb.blogspot.com/2015/05/marquesa-presente-sempre.html
https://www.otvfoco.com.br/jorge-lafond-a-vera-verao-deixa-heranca-milionaria-e-marido-do-ator-entra-na-justica-para-brigar-pelos-seus-direitos/
https://fabiosa.com.br/ctclb-rsasl-audqr-pbgic-phlvn-vera-verao-restos-mortais-desaparecem/
https://www.letras.com.br/osvaldo-nunes/curiosidades