Faleceu ontem, de pneumonia, a atriz e cantora Cláudia Celeste, de 66 anos de idade.
Cláudia não era “apenas” uma artista estupenda e completa, capaz de sempre aprender novas tecnologias; era também um ser humano fantástico, generoso, dotado de incrível delicadeza e lealdade.
A conheci em um dos eventos por ocasião do Dia da Visibilidade Trans, promovido pela Coordenadoria Especial da Diversidade, da Prefeitura da cidade do Rio de Janeiro, gestão Carlos Tufvesson. Ela me procurou porque desejava publicar um livro que resgatasse a trajetória das artistas transformistas. Na ocasião, disse-lhe, era-me impossível, pois encontrava-me em fase final do curso de doutorado, elaborando a escrita da tese. Tempos depois nos reencontramos e retomamos o projeto. Ela possuía profundo senso da necessidade de se preservar essas memórias. Conversamos diversas vezes, por telefone e pessoalmente. Ela me passou o material que já havia elaborado, chegamos a construir uma agenda de trabalho, mas a coisa não avançou.
Lamento profundamente a partida tão precoce de uma artista ainda em plena força produtiva. Em cinco de março último ela anunciava, no seu canal do YouTube, o lançamento para breve de um CD onde interpretava sucessos, intitulado Bossa Nova ao Vivo, Cláudia Celeste.
Viveu uma vida de coragem, ousadia, determinação, com talento, brilho, respeito, tato, delicadeza com o outro e dignidade. Ficam os afetos construídos e a memória de sua bela e digna trajetória.
Em 2016 foi publicado o artigo “Artes de Acontecer: viados e travestis na cidade do Rio de Janeiro, do século XIX a 1980“, onde registro um pouco de sua trajetória, juntamente com a de outras precursoras.
Seu enterro foi hoje, no cemitério de Irajá, bairro de seu nascimento e moradia.
Dela disse o pesquisador Diego Nunes, no seu perfil numa rede social:
Em 2015 publiquei meu segundo livro, chamado “Cá e Lá, o Intercâmbio Cinematográfico entre o Brasil e Portugal”, e uma grata surpresa que tive foi o carinho da comunidade LGBT por ter incluído uma pequena bio da travesti Ivaná, uma pioneira do Teatro de Revista Brasileiro. Este livro me proporcionou várias recompensas que vão além do material (que aliás, isto eu realmente não tive). Recebi uma carta carinhosa de Rogéria agradecendo por lembrar daquela que abriu a porta para as novas gerações. Também recebi mensagens carinhosas de Claudia Celeste, que em plena ditadura militar, atuou na novela Espelho Mágico (1977) . Nunca aconheci pessoalmente, mas fiquei muito comovido com suas palavras. Através de seu Facebook soube hoje do seu passamento. A Claudia Celeste, minha homenagem. Sua missão foi cumprida!
Ela deixa bastante material em seu canal no YouTube
O jornal o Globo noticiou a perda. https://oglobo.globo.com/cultura/primeira-travesti-atuar-em-uma-novela-brasileira-morre-aos-66-anos-22680740